sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Ano que vai, ano que vem

fonte: Expositor Cristão Jan/2011

O que, de fato, termina quando um ano se encerra? A vida das pessoas é feita de muitas etapas, que se somam, resultando em realizações ou frustrações pessoais, profissionais e familiares. O final de um ano e início de outro é sempre uma etapa de avaliação, de retrospectiva. O povo de Deus na Bíblia, muitas vezes, fez esse tipo de “balanço”, para destacar a força da presença divina em cada momento do ano ou da sua história (Sl 78).

Um balanço da vida

No Salmo 124, quem ora afirma que a luta da vida foi muito grande, ao dizer: “Não fosse o Senhor que estivesse ao nosso lado...” (v.1). Para o salmista, apenas a proteção divina pode impedir que as ameaças destruam a vida. Ele se sente livre, depois do desafio, e afirma: “O nosso socorro está em o nome do Senhor, que fez o céu e a terra” (v. 8). Para o orante do Salmo 67, o período das colheitas encerra um ciclo de esperanças e expectativas que tem um final feliz: “A terra deu o seu fruto. E Deus, o nosso Deus, nos abençoa” (v. 6).
Outro momento de avaliação do povo de Deus aconteceu quando, depois de uma luta contra os filisteus, Samuel, profeta e juiz, coloca uma pedra entre as cidades de Mispá e Sem, como um marco do avanço de Israel. Com este gesto, Samuel declara: “Até aqui nos ajudou o Senhor” (1 Sm 7.12). Os marcos, aliás, são algo muito importante em nossas vidas. Quando atingimos determinada etapa, sonho ou fase da caminhada, é muito comum que esses momentos se tornem marcos para nós. Desta forma, o final de um ano não é, necessariamente, o final de uma etapa, mas a possibilidade do passo seguinte; da revisão das metas; do novo olhar para dentro de nós mesmos; para uma nova aproximação de Deus.

Viver e amadurecer
Com o final de mais um ano, percorremos o caminho da maturidade pessoal, familiar e religiosa. Vivemos um ano muito difícil e cheio de pedras e espinhos. Vimos como a violência entrou nas casas, levando filhos a matar os pais e vice-versa. Vimos conflitos internacionais e demonstrações de poder e subjugo dos povos. Vimos, no caso da nação brasileira, um sentimento de vitória e renovo na posse da nova presidenta.
Mas, por outro lado, presenciamos a continuidade da impunidade pública e a continuação do domínio dos chefões do narcotráfico por toda a parte, apesar das afirmativas em contrário. Todas essas situações podem ser oportunidade de todos/as nós, como sociedade, pararmos para refletir sobre nossa atuação cidadã. Se fizermos isso de forma consciente e libertadora, é possível que o ano de 2011 nos permita escrever linhas mais solidárias, justas e igualitárias... (Jr 29; 31.17; Pr 23.18).
Em síntese, o final do ano é um marco em nossa trajetória. Olhando para trás, podemos aprender com nossas limitações, dúvidas e ansiedades, tornando-nos mais amadurecidos para o ano seguinte (Lm 3.21). Também é preciso fazer prospectivas, projetos para o novo ano que se aproxima.

Expectativas de futuro
O salmo 121 fala das expectativas diante dos desafios apresentados pela vida: “Elevo os meus olhos para os montes: de onde me virá o socorro” (v. 1)? Ao iniciar um novo ano, este mesmo conflito se coloca diante de nós. De onde vem a nossa esperança, onde depositamos nossas expectativas? Hoje, porém, as pessoas estão colocando sua confiança sobre outras bases, que não o Senhor, quando pensam em seu futuro. Pesquisas divulgadas em todos os anos nos meios de comunicação afirmam que os/as jovens estão se preocupando primeiro com a segurança do diploma universitário e de uma carreira profissional. Depois vêm os outros fatores, como a constituição de uma família, por exemplo.

O salmista prossegue em sua oração dizendo que o seu socorro vem do Senhor, que é maior do que os montes, porque fez o céu e a terra (v. 2). A esperança precisa estar depositada na fonte correta, para que não se desfaça ou leve ao desengano. A esperança de um futuro melhor não pode estar centrada no eu, tão somente se eu consigo um bom emprego ou um curso superior; mas na soma dessas coisas com a minha fé, minha família e demais valores de uma existência.

E, por fim, essa esperança correta dá coragem para se tornar um peregrino, um caminhante em direção ao local da adoração, em Jerusalém. São diversas as expressões do salmo sobre essa caminhada confiante: “o Senhor é quem te guarda; o Senhor é a tua sombra à tua direita. De dia não te molestará o sol, nem de noite, a lua. O Senhor te guardará de todo o mal; guardará a tua alma” (v. 5-7). Entre essas expressões, destaca-se ainda: “... não permitirá que teus pés vacilem” (v. 3). Além do sentido próprio deste texto, também podemos inferir que a presença de Deus em nossa vida nos permite tomar decisões firmes, sem ter que “pisar em ovos” ou percorrer “areia movediça”.
A certeza de que Deus caminha conosco é a grande fonte que alimenta a chama de nossa vida. Assim, o ano que vem não será aguardado com ansiedade e temor, mas com alegre expectativa e regozijante esperança: pois Deus é aquele que te guarda, que guarda a tua saída e a tua entrada em cada ano e em cada decisão, até a chegada final aos portões eternos! (v. 8).

Rev. Otávio Júlio Torres
Igreja Metodista em Caguases, MG, 4ª Região
www.sofiaeteo.blogspot.com

Dicas para um ano novo na presença de Deus - sermão de ano novo Cataguases

Texto bíblico: Hebreus 10.19-23

1. Aproximemo-nos: precisamos desenvolver relacionamentos. Para isso, temos de estar próximos. Isso inclui reconhecer os limites das pessoas, suas necessidades e desejos, suas particularidades e riquezas no convívio. Por isso, a aproximação requer coração sincero e purificado, bem como o corpo lavado (o batismo é um sinal visível do Reino; ele nos dá acesso à comunidade de fé, nos faz filhos de Deus e é sinal de unidade).

Cântico: Perto quero estar

2. Guardemos a confissão da esperança: temos vivido tempos de reclamações, tristezas e incertezas. Temos de ter em mente a esperança cristã, que consiste em saber que Deus é o guardião final de nossa história, o autor de nossa vida e que sua vontade é boa, agradável e perfeita para nós; que tudo coopera para o bem dos que amam a Deus.

Cântico: Minha esperança está no Senhor

3. Consideremo-nos uns aos outros: pessoas felizes são aquelas que estabelecem relacionamentos. É hora de reconhecer as pessoas que neste tempo nos têm abençoado por partilharem conosco sua existência. É hora de dizer obrigado, me perdoe, eu te amo, eu te perdoo e todas essas expressões que nos conectam uns aos outros na família, na igreja e na sociedade. Considerar uns aos outros é, segundo o autor de Deus, estimular ao amor e às boas obras. Alguém considerado também passa a considerar e as coisas são transformadas!

Cântico: Aliança do Senhor

4. Não deixemos de congregar-nos. A vida em Cristo se expressa em sua forma visível, qual seja, a Igreja local. Não falo de estruturas, embora estas sejam necessárias, mas do reconhecimento de pertencermos a um grupo no qual temos espaço para acolhida, serviço e crescimento.

Cântico: Fico feliz em vir em tua casa

5. Devemos ver que o Dia se aproxima. Quanto mais os anos passam, mais nos aproximamos do dia em que estaremos diante de Deus. Seja porque morreremos, seja porque Ele virá (eu creio, embora haja quem duvide). Desta forma, devemos ter diante dos olhos que nossa vida não é passageira, no sentido de fútil, mas singular. Nossa oportunidade de felicidade e realização é aqui, agora. O tempo de servir a Deus é este. Embora venhamos a sonhar com o gozo celestial, isso jamais deve diminuir a importância e o valor desta vida. Devemos viver como se cada dia fosse único e precioso. Porque, de fato, é.

Cântico: Deus enviou seu filho amado

Feliz ano novo!

Hideide Brito Torres

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

“NÃO TEMAS, PORQUE MAIS SÃO OS QUE ESTÃO CONOSCO DO QUE OS QUE ESTÃO COM ELES” (LEIA 2 REIS 6.8-23)

Otávio Júlio Torres


Visão de Deus: é o que precisamos em dias como os de hoje. Dias em que sofremos tantas perseguições e tribulações; dias em que muitas pessoas olham para as igrejas e seus dirigentes com desconfiança (e existem razões para fazerem isso); dias em que a opção de muitos é pela desistência ou descrença em Deus. Sobretudo, é preciso visão de Deus para reconhecer que “mais são os que estão conosco do que os que estão com eles”.

Minha palavra nesta pastoral é para você que crê em Deus, mas se encontra na situação do jovem que acompanhava o profeta Eliseu, a temer a força e número dos inimigos à volta, prontos para arrebatá-lo. A única coisa que lhe restou foi o desespero, expresso em suas palavras: “Ai! Meu senhor (Eliseu)! Que faremos? Porque é exatamente isso que os inimigos de Deus querem fazer conosco: quer que os temamos! Porque assim, minarão todas as nossas forças, não permitindo que vejamos mais nada, senão a incapacidade de acreditar, de ter a visão de que “os que estão conosco são maiores do que os que estão com eles”.

Deus quer que você olhe ao redor e não veja somente a opressão que o cerca, que lhe faz temer, que lhe faz desistir dos “sonhos de Deus” para a sua vida. Deus quer que você olhe novamente e veja que Ele já providenciou tudo o que você precisa: a libertação e a vitória sobre as milícias do mal. No entanto, você pode estar perguntando: o que eu faço para não ver somente a opressão dos inimigos e temer, mas para ser capaz de ter a visão de Deus? A resposta está com o profeta Eliseu. Vamos seguir os seus passos:

Seja conhecido como um “homem (ou uma mulher) de Deus”: É um título bíblico que expressa a estreita associação de uma pessoa com Deus. Na Bíblia, somente Samuel, Elias e Eliseu (1Samuel 2.27; 9.6; 2 Reis 17.18; 4.9) foram dignos desse nome. É verdade que, mais tarde na história do povo de Israel, esse nome é substituído por “profeta de Deus”, que significa aquele que fala em nome de Deus, aquele que é mensageiro de Deus. Isso pressupõe, portanto, que o homem de Deus é aquele a quem Deus confia os seus mistérios. A partir de Jesus, os homens de Deus passaram a ser chamados de discípulos e discípulas a quem Deus dá a conhecer os seus mistérios (Marcos 4.11). Mas o grande segredo é que os homens de Deus não dão a si mesmos esse título, nem mesmo os discípulos escolheram serem assim chamados. Aceitaram a vocação de Deus e foram reconhecidos pelo povo. Com eles estavam os sinais de Deus. Eliseu fez um manancial de águas más se tornarem saudáveis, multiplicou o azeite da viúva, fez fértil o ventre de uma estéril, ressuscitou um morto, multiplicou pães, curou um leproso, fez flutuar um machado e cegar um exército inimigo (2 Reis 2.19-6.23). Aos seus discípulos, Jesus lhes disse que seriam acompanhados de sinais: “Em meu nome, expelirão demônios; falarão novas línguas; pegarão em serpentes; e, se alguma coisa mortífera beberem, não lhes fará mal; se impuserem as mãos sobre enfermos, ficarão curados” (Marcos 1617-18).

O poder da oração: Alguém já disse que oração é ação. E é exatamente o que Eliseu faz imediatamente depois encorajar o rapaz. Primeiro, intercede por seu discípulo: “Senhor, peço-te que lhes abras os olhos para que veja”. Eliseu já havia sido discípulo de Elias e adquirido experiência com Deus; agora era a hora de passar adiante. Sua oração nos ensina que é preciso todo o povo de Deus ter a mesma visão, para que ocorra a mudança da realidade. A segunda oração é mais ampla: “Fere, peço-te, esta gente de cegueira”. A realidade é completamente transformada: os inimigos, agora, estão subjugados. Mas o interessante na continuação da narrativa é que o homem de Deus não responde à ação dos inimigos com a mesma “moeda”, mas os abençoa e despede em paz. Hoje sabemos, com o apóstolo Paulo, que “a nossa luta não contra o sangue e a carne, e sim contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais, nas regiões celestiais” (Gálatas 6.12). A oração é a porta para o mover de Deus. Quando oramos, Deus age.

Portanto, “não temas, porque mais são os que estão conosco do que os que estão com eles”.

Dia de Ação de Graças: “Ninguém apareça de mão vazias perante mim”

Otávio Júlio Torres

Na Bíblia, os motivos de ação de graças a Deus abrangem uma série de situações bem diversificadas. Noé, após um ano na arca, ao desembarcar com seus familiares, ofereceu sacrifícios de louvor a Deus (Gn 8.20-21). Salomão, ao dedicar o Templo, ofereceu a Deus 20 mil bois e 100 mil ovelhas (1Rs 8.62-63). Jesus, conforme os evangelhos, ensinou-nos a agradecer a Deus pelo alimento (Jo 6.11,23), pela saúde (Lc 17.16). O apóstolo Paulo agradece pelo alimento (At 27.35; Rm 14.6; 1Co 10.30; 1Tm 4.13), pela paz (At 24.2) e livramento de perigos (At 27.35; 28.15); pela comunhão no evangelho (Fp 12.13) e pelo crescimento do evangelho (Fm 4); e pelo amparo recebido de Deus e da Sua Igreja (Rm 7.25; Rm 16.4; 1Co 1.14; 14.18; Fm 4; 1Ts 5.18; Rm 1.21; 1Co 1.4; Cl 4.2; Fp 4.6; Cl 3.17.; Ef 5.4). Por tudo isso, a conclusão do apóstolo em 1 Tessalonissenses 5.15: “Em tudo, dai graças”!

No entanto, como marco celebrativo, o dia de ação de graças está diretamente relacionado com a gratidão a Deus pelo fruto da terra, recebido como bênção divina (Dt 16.10). A história dessa celebração no ocidente também reporta a este contexto. Peregrinos ingleses, de tradição protestante, vindos aos Estados Unidos, celebram um dia de ação de graças a Deus pela abundante colheita que fizeram depois de enfrentar grandes dificuldades para se estabelecerem no “Novo Mundo”.[1]

Na Bíblia, o povo de Deus realizava uma Festa chamada xavu‘ot[2], conhecida como Festa das Semanas ou da Sega, celebrada ainda hoje em nossas igrejas como Festa das Primícias. Seu elemento principal é a gratidão e o reconhecimento da provisão de Deus pelos primeiros frutos do trabalho no campo. O relato bíblico mais antigo desta festa está em Êxodo 23.16a: “Guardarás a Festa da Sega, dos primeiros frutos do teu trabalho, que houveres semeado no campo”.

Sua mensagem para a nossa vida não está relacionada apenas com o seu sentido direto de agradecimento a Deus pelas bênçãos de mantimentos recebidas. Na verdade, como celebração de gratidão a Deus, ela é o fruto do relacionamento íntimo com Ele, adquirido nas solenidades anteriores. Há necessidade de uma preparação prévia para participar desta celebração. As festas da Páscoa e dos Pães Ázimos preparam o espírito para xavu‘ot, quando levam o povo à confissão de pecados, à purificação, à santificação e à obediência ao Senhor. Essa preparação é que despertará gratidão no coração, gerando as ofertas, a adoração e o louvor prestados ao Senhor na celebração do Dia de Ação de Graças.

Levíticos 23.15-21 relata os detalhes do ritual desta festa, em três momentos:

1. Uma nova oferta de Cereais ou Oblação (homenagem) deve ser entregue. São as primícias ao Senhor, oferta movida diante Dele (movimento de levantar e baixar a oferta). Também são oferecidos dois pães cozidos, feitos com o trigo da nova colheita e fermento. Estes pães representam o povo. Um pão é dedicado no holocausto e o outro, como oferta pelo pecado. Isso marca a importância da presença de todo o povo como parte do ritual.

2. Oferta pelo pecado, como marca de arrependimento, confissão e purificação. Devem ser oferecidos ao Senhor um bode e dois cordeiros de um ano com o pão das primícias.

3. Sacrifícios pacíficos. Falam da paz e da comunhão do povo com o Senhor. As pessoas tinham acesso a comer destes sacrifícios porque, anteriormente, houvera a purificação do povo. Assim, era possível chegar diante do Senhor em adoração, louvor e gratidão. A partilha dos alimentos comidos pelo povo é o diferencial aqui. Além disso, o seguimento do texto (v.22) garante a extensão da bênção do fruto da terra também aos pobres e estrangeiros.

A grande mensagem que precisamos aprender para celebrar o Dia de Ação de Graças ao Senhor é que ninguém deve aparecer de mãos vazias perante Ele. Dedicar as primícias do nosso trabalho a Deus só faz sentido quando lhe dedicamos nossa vida em confissão, purificação, santificação e obediência.

É importante ainda destacar que se trata de uma celebração realizada em meio a muita alegra, regozijo e gratidão. Uma festa em que todos os feitos de Deus são a medida para as ofertas dedicadas, tendo o coração grato e voluntário.

Estes princípios devem sempre ser relembrados e compartilhados na vida da igreja, como parte da formação cristã do nosso povo, com vistas ao seu crescimento. O aspecto ritual da festa nos ensina que a repetição, o memorial e a ampla participação do povo são marcantes para uma educação efetiva e a formação da identidade do povo. Isto valia para os israelitas e valem também para o povo cristão.



[1] Para um melhor conhecimento histórico do Dia de Ação de Graças, consultar http://www.bonde.com.br/bonde.php?id_bonde=1-12--120-20081127

[2] Consulte o texto do professor Tércio Machado Siqueira para mais detalhes, no link: http://www.metodista.br/fateo/materiais-de-apoio/estudos-biblicos/a-festa-de-pentecostes-no-antigo-testamento

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

"Todo Mundo" quer ser Bispo/a Metodista

Postagem do blog: http://queroserbispo2011.blogspot.com


Por que o episcopado na Igreja Metodista tem exercido tanta atração? Por que a sucessão episcopal tem se tornado um tema tão alvissareiro no meio da pastorada? Por que cresce o número dos que “almejam o episcopado”?

Eu tenho algumas hipóteses:
1. Todos os pastores/as presbíteros/as são automaticamente candidatos/as ao episcopado. Você já viu alguma instituição ter mais candidatos que eleitores? Na Igreja Metodista é assim! São uns mil candidatos para uns cento e oitenta eleitores!
2. O salário de Bispo/a pode ser até 20 vezes maior que o salário de um pastor/a, sem contar outros benefícios.
3. Para ser Bispo/a não é importante ter coerência entre discurso e prática, mas ser conhecido nas áreas regional e geral.
4. Para ser Bispo/a não é preciso ter tido competência no exercício pastoral em igrejas locais.
5. Para ser Bispo/a não é necessário ter facilidade de expressão oral e escrita. É só ouvir e ler o que alguns falam e escrevem. Até lembram as “pérolas do Enem”!
6. Para ser Bispo/a não é necessário possuir firmeza doutrinária. Em termos de doutrina, vale tudo na Igreja Metodista!
7. Para ser Bispo/a não é preciso conhecer um pouco de história e teologia do metodismo. Aliás, vale tudo também quando se fala sobre “os Wesley”!
8. Para ser Bispo/a não é necessário conhecer um pouco de Bíblia. Ela é apenas um pretexto para um discurso já pronto.
9. Para ser Bispo não é preciso ter o mínimo de interesse em conhecer a realidade espiritual, social, econômica e política da cidade, da região, da nação.
10. Para ser Bispo/a não é importante zelar pela unidade da igreja. Pelo contrário, quando mais cedo o “candidato/a” se rotular e dar “segurança” aos seus partidários de que vão “reinar”, melhor.
11. Nomeação de pastores/as já não é instrumento para promover edificação e missão, mas moeda para pagamento de campanha eleitoral-episcopal e instrumento para punir quem pensa diferente, quem não pertence ao “partido”.
12. Para ser Bispo/a é mais importante ter uma mente administrativa do que pastoral – mesmo que na prática se consiga falhar nos dois aspectos.
13. A congregação local pode ser tratada apenas em termos estatísticos: Quantos são? Quanto produzem? Quanto rendem? A relação já não é de pastor/ovelha, mas vaqueiro/gado.
14. Ser Bispo/a é libertar-se definitivamente da congregação local. É uma indignidade alguém que tenha sido Bispo voltar a ser pastor! Quando essa chance aparece pela não reeleição ao episcopado (que é uma grande ofensa!), trata-se logo de dar um título, um cargo, porque a experiência dele não pode ser “desperdiçada” na igreja local.
15. Para ser Bispo/a é preciso ter capacidade de liderança, mas não segundo o Evangelho. O principal sentimento que um Bispo deve gerar nos seus “liderados” é o medo. Por isso, um livro de cabeceira indispensável é O Príncipe, de Nicolau Maquiavel.

O episcopado tornou-se atrativo porque pode-se chegar até ele e exercê-lo sem os requisitos bíblicos e canônicos.

Contudo, não foi assim “no princípio”! É só ler 1 Pedro 5.1-3, 1 Timóteo 3.1-7, Tito 1.7-9.

Quem é “suficiente para essas coisas”?

Maurício Ramaldes*
São Paulo, junho de 2009.

*foi pastor metodista e é membro da IM Bela Aurora, Juiz de Fora, MG.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Jesus e o discipulado

Otávio Júlio Torres

O discipulado foi o modo particular de Jesus anunciar o Evangelho e reunir em torno de si seus primeiros seguidores. A proposta desta reflexão é apontar alguns caminhos usados por Jesus ao exercer seu discipulado e formar uma liderança capaz de gerar e sustentar sua igreja.

Jesus ensinou e treinou os discípulos
Jesus tinha um ministério de ensino privado, além daquele que utilizava para todo o povo. Ele ensina na sinagoga (Marcos 1.21), como fez em Nazaré (Lucas 4.16-21) ou “do alto do monte falando às multidões” (Mateus 5). Mas esse ministério não bastava para Jesus medir bem o aprendizado de seus discípulos, nem orientar ou corrigir de modo particular, como fez com Pedro (Marcos 8.31-33) ou com Tiago e João (Lucas 9.54). Ele investia mais tempo, em particular, com os doze discípulos, certamente considerando suas personalidades e conversão sincera.
Jesus instruiu seus discípulos nas verdades do Reino e eles fizeram o mesmo em relação a outros (Atos 20.25). Nós devemos fazer o mesmo. Assim, fica clara a necessidade de existirem níveis de ensino com os novos discípulos, para seu crescimento na vida cristã (Atos 14.21-22).

Jesus demonstrou como fazer, como sinalizar o reino
A autoridade de Jesus se baseava no fato de que Ele vivia aquilo que ensinava. Ao vê-lo em ação, pessoas diziam: “O que é isso? Um novo ensino com autoridade!” (Marcos 1.27). Os fariseus tinham aparência e formalidade, mas não conseguiam viver integralmente o ensino ministrado. Paulo denuncia tal fato também (Romanos 2).
No texto do lava-pés (João 13), Pedro reagiu a Jesus: “Nunca me lavarás os pés”, porque entendia “autoridade” e “posição” como superioridade. Rabi (Raboni) era o mestre escriba, cujo nome pode ser traduzido por “meu Senhor”, como uma posição de alto destaque e importância social.
Mas Jesus cingiu-se com uma toalha – como faziam os servos aos seus senhores – e, tomando água, passou a lavar-lhes os pés, recomendando-lhes seguir o exemplo (João 13.14-15) e disse: “O empregado não é superior ao patrão, nem o mensageiro mais importante do que aquele que o enviou” (João 13.16). Não basta falar, é preciso agir.
Jesus usou parábolas ao ensinar sobre o Reino de Deus: “...é semelhante a um tesouro oculto no campo” (Mateus 13.44). Essa ilustração usa fatos da vida comum aos seus ouvintes; demonstra uma situação prática. Devemos buscar nossa coerência entre o ensino e a ação. Mas não se trata de uma imagem idealizada e perfeccionista. As pessoas discipuladas devem entender que a limitação humana existe e, por isso, erros podem ocorrer, mas que a graça nos redime e nos reorienta a uma vida justa, santa e vitoriosa, como foi a do Mestre Jesus.

Jesus deu responsabilidade aos seus discípulos (Mateus 10; Lucas 9-10)
Os discípulos aceitaram a Jesus e à sua mensagem, aprenderam com ele, mas era preciso assumir uma responsabilidade, atender a um chamado radical e responsável. A autoridade e poder recebidos do Mestre não são um fim em si mesmos, mas uma capacitação para cumprir a missão.
Ao saírem pelas aldeias e cidades, eles se tornavam conhecidos como discípulos/testemunhas de Jesus, comprometidos com Ele. Pelo envio, aprenderam que eram capazes. A sua euforia no retorno (Lucas 10.17) mostra o quanto se sentiram encorajados e confiantes. Já podiam ser sujeitos, ministros e agentes do Reino.
Quando discipulamos, devemos oferecer responsabilidades práticas aos novos crentes, de acordo com suas experiências, e acompanhá-los na devida instrução e demonstração, como Cristo o fez.
Infelizmente, hoje, a maioria dos “cristãos” é mera espectadora. Ao serem recebidos, esses novos crentes não foram preparados e até desafiados a atuar como discípulos. E, uma vez que não aceitam ter responsabilidades na Igreja, eles não chegam a experimentar a alegria do “retorno”, nem a euforia e a testificação das bênçãos que, pelo nome e poder de Jesus, aqueles discípulos alcançaram (Lucas 10.17-24).

Jesus acreditou que os seus discípulos iriam discipular
Na conhecida oração sacerdotal (João 17), Jesus expressa sua vontade quanto à continuidade de sua obra por meio dos discípulos: “Assim como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo” (João 17.18).
Apóstolo quer dizer enviado; e com a missão de fazer outros discípulos: “vos designei, para que vades e deis fruto, e o vosso fruto permaneça” (João 15.16). Outras pessoas seguirão aos discípulos como seguiram a Jesus (João 15.20). Mas observe: está prevista a rejeição. Mais ainda: a perseguição há de acompanhar o ministério do verdadeiro discípulo. Portanto, o crescimento ocorre por meio da fidelidade e da luta do dia-a-dia.

“Se não respondo por mim, quem responderá por mim? Mas se só respondo por mim, serei ainda eu?"

Otávio Júlio Torres

Caro Júnior,

Estive pesquisando a respeito. Pelo menos, parece verossímil dizer que este pensamento aparece, pelo menos, em Platão e em Tomas de Aquino. Todavia, pesquisei um texto na net intitulado “Da responsabilidade à compaixão”, em que o autor Manoel do Carmo Ferreira, do Instituto S. Tomas de Aquino, remete essa frase a um escrito da Antiga Babilônia, classificado como um Talmud. É interessante esta classificação, pois a palavra Talmud é hebraica e designa um conjunto de registros rabínicos que remetem ao estudo da lei, dos costumes e da história do judaísmo, estando subjugado somente à Bíblia hebraica (livros bíblicos do Antigo Testamento, conforme traduzidos na versão da Bíblia Protestante da língua portuguesa. Em todo caso, como o povo babilônico é anterior e fonte da cultura judaica, não há prejuízo em manter este ditado como um talmud, entendendo-o como um conjunto de registro babílônico antigo sobre leis, costumes e história deste povo.

Sendo assim, cabe-nos um grande desafio em entendê-lo, interpretá-lo correntamente, uma vez que foi escrito por uma cultura e pensamento, historicamente, tão distantes de nós.

Considerado um talmud, pode-se interpretar essa frase na direção de estabelecer o lugar do ser na história e na sociedade. A frase toca a pergunta sobre sua identidade e seu modo de ser no mundo.

A primeira pergunta – Se não respondo por mim, quem responderá por mim? – toca exatamente a questão da identidade pessoal. Na constituição do Ser individual, é de suma importância pontuar a autoafirmação. Dizia Descartes, um filosófo frances racionalista, do começo da era moderna, que para se afirmar a existência, o ser de algo, é preciso que ele seja completamente uma realidade clara e distinta de qualquer outra. Daí, o Ser sempre está em busca de colocar-se no mundo como indivíduo, autor de seus próprios atos, responsável por si mesmo.

No entanto, a segunda pergunta – Mas se só respondo por mim, serei ainda eu? – levanta outro questionamento, que nos leva a considerar, filosoficamente, a partir de três posturas existenciais distintas sobre a presença do ser humano no mundo. O Determinismo absoluto é a visão de mundo que estabelece o fato de que cada um dos acontecimentos do universo estaria submetido às leis naturais, entendidas dentro de uma estrutura de causa. Nesta caso, todos os seres do universo estão predestinados, entregues a um destino causal, que determina todos os atos da sua existência. Essa doutrina não permeia o pensamento acima.

Ainda, há a doutrina do livre-arbítrio. Os seus defensores dizem que ser livre significa decidir e agir como se quer, independentemente de causa determinante. Nas palavras de Sartre, “o ser humano está condenado a ser livre”. Esta visão de mundo é capaz de traduzir a frase acima com um SIM. Ou seja, exatamente eu respondendo por mim mesmo, e somente eu fazendo isso, é que encontro e estabeleço minha identidade no mundo. Determino o meu EU, inalienavelmente. Só que, entendendo o pensamento a partir desta visão de mundo, o seu autor estaria dizendo que todo o Ser no mundo estaria entregue ao acaso. Cada um sendo inalienavelmente livre, não haveria conceitos ou palavras tais como: referência, parâmetro, perspectiva, visão de mundo...

Finalmente, os filósofos modernos instituíram o determinismo moderado, que conjuga as duas visões de mundo anteriores. Esta é entendida a partir de certa liberdade de decisão e de ação, uma conduta consciente, sem, contudo, deixar de estar inserida numa compreensão de causalidade e razões (necessidades) inerentes. Spinoza, Hegel, Marx e Engels são alguns dos filósofos que entenderam o ser humano assim. Aqui, liberdade e causalidade não se excluem. Esta concepção da existência colocaria a pergunta – Mas se só respondo por mim, serei ainda eu? – numa linha de raciocínio da ética. Ou seja, para cada passo do Ser (humano) é preciso ponderar sobre suas possíveis causalidades ou perguntar se se trata de um ato de liberdade. Assim, posso ser eu ainda, mesmo que seja uma resposta unicamente minha, pois me constituo um Ser dentre os demais. Dependendo da resposta exigida por mim, sou parte de um SER maior, presente em todos os seres e conduzindo todos os seres para uma única história, como definiu Hegel: “A liberdade é a necessidade compreendida.”

sábado, 4 de setembro de 2010

Porque não quero ser membro da Igreja...

Hideide Brito Torres

Não quero ser membro da Igreja porque posso participar dos ministérios, da Santa Ceia, ser dizimista, estar nos cultos sem a necessidade de um ritual ou um pedaço de papel que me diga o que sou ou não. Se você pensar bem, esta é a mesma razão pela qual as pessoas querem “morar junto” hoje em dia, sem estar casadas legalmente. É ter as recompensas sem o peso dos deveres. O outro nunca pode exigir nada, porque, se eu não gostar mais, posso simplesmente ir embora sem ter de dar satisfações a ninguém.

Não quero ser membro da Igreja porque gosto de circular por aí, conhecer novas ideias e novas pessoas. Ser membro significa aderir a um conjunto de preceitos e eu não gosto que ninguém me diga o que pensar ou não. Existem coisas com as quais eu não concordo na Igreja, até mesmo doutrinárias. Sem ser membro, não tenho compromisso com nada disso.

Não quero ser membro da Igreja para não ter a responsabilidade pessoal de zelar pelo meu testemunho em relação a ela. Se alguém me perguntar alguma coisa, digo simplesmente que frequento, estou visitando, vendo “qual é”.

Não quero ser membro da Igreja para não ter a responsabilidade pessoal de zelar pelo meu testemunho em relação a ela. Se alguém me perguntar alguma coisa, digo simplesmente que frequento, estou visitando, vendo “qual é”.

Não quero ser membro da Igreja para não ter de sustentar as coisas chatas que toda Igreja tem. Posso fazer o que quiser, sem ser requerido. Não tenho a obrigação de amar ninguém nem de sustentar ninguém com minhas orações. Se alguém pegar no meu pé, posso ameaçar ir para outra comunidade, quem sabe fazer alguma pressão por causa do dízimo que entrego. Ao fazê-lo, fico aparentemente mais fiel do que aquele que, sendo membro, não faz tudo o que eu faço.

Só que há alguns problemas... mas eu não gosto de pensar muito sobre isso.

Quando não assumo integralmente meu papel como membro da Igreja, vivo parcialmente o amor de Cristo. Não serei nunca capaz de “alegrar-me com os que se alegram e chorar com os que choram” (Rm 12.15), porque meu envolvimento é sempre parcial. Sem conhecer o amor verdadeiro, posso ter todos os demais dons, mas de nada eles me adiantarão (1Co 13).

Quando eu entrego fielmente o dízimo, compareço aos cultos e participo dos ministérios, não estou fazendo favor algum à Igreja, ao pastor ou pastora, nem sendo mais santo que os membros assumidos que não o fazem. O erro deles não justifica minha arrogância. De certo modo, eu fico parecendo o fariseu que subiu ao templo para orar (Luc 18.9-14). Estou apenas cumprindo meu dever cristão, mas se faço isso apenas para não ser cobrado, então “já recebi minha recompensa” (Mt 6.6).

Quando eu não me torno membro da Igreja, torno-me uma anomalia, uma parte do corpo de Cristo que quer viver de si mesma. Mas um membro não pode ser separado do corpo sob o risco de morte, assim também, fora do corpo de Cristo, morremos, uma vez que a comunhão plena alimenta a espiritualidade saudável (1Co 12-14).

Se Cristo amou a Igreja e chegou a ponto de morrer por ela, quando não assumo integralmente meus votos numa comunidade local, corro o risco de situar-me fora desta esfera de amor, de santidade e de incorruptibilidade, mesmo considerando os defeitos e infortúnios que ela, como comunidade humana, santa e pecadora (no dizer de Martim Lutero) pode conter (Ef 5.25-27). Ao contrário, importa-me sofrer por ela: “Regozijo-me agora no que padeço por vós, e na minha carne cumpro o resto das aflições de Cristo, pelo seu corpo, que é a igreja” (Cl 1.24).

O fato de ser membro de uma Igreja é consequência do fato de que me entreguei a Cristo, vivo por ele. É uma manifestação visível da transformação invisível que Deus opera no meu interior. Devo me alegrar por isso, e não achar-me sob o peso de uma obrigação. Damo-nos primeiro a Deus e depois uns aos outros na comunidade de fé (2Co 8.5). Como poderei dar-me por inteiro a alguém se não quero assumir publicamente meu compromisso para com essa pessoa ou grupo, de todos os meios e formas pelas quais me for possível fazê-lo?

Somente o fato de ser membro de uma igreja me dará a autoridade do reconhecimento que vem dos irmãos e irmãs, legitimando meu ministério junto a eles e tornando mais amplo o espectro da minha ação. Por ter-me como seu igual, companheiro de jugo e de lutas, com maior profundidade poderão testemunhar de mim e sentir que estou 100% com eles, como aconteceu com Tito (2Co 8.16-23). Os membros da Igreja são neste texto chamados de “companheiros no desempenho da graça”, “companheiros e colaboradores”, “mensageiros da Igreja”, “glória de Cristo”. E Paulo lhes exorta a demonstrar “a prova do amor e da exultação” perante a Igreja quando membros desse porte estiverem diante dela.

Se há sobre a comunidade um pastor ou pastora fiel, com amor no coração, atenção e fidelidade para com os princípios bíblicos e doutrinários, minha insubmissão é sinal de rebeldia ao Senhor e ao seu corpo. Tenho de considerar profundamente as motivações que me levam a não querer uma autoridade espiritual sobre mim. É claro que há os que abusam, mas a Bíblia chama a estes de mercenários. Os pastores e pastoras verdadeiros são reconhecidos por sua autoridade vinda do Espírito, seu amor e zelo pela comunidade, sua seriedade no testemunho e na oração. A estes, a carta aos Hebreus recomenda obediência e submissão (Hb 13.17). Tenho de admitir se não quero que o pastor ou pastora me oriente espiritualmente porque ele ou ela não é uma pessoa de Deus (e isso não cabe a mim, individualmente, decidir) ou se é porque esta liderança espiritual me confronta diretamente em meu coração endurecido, em meus pecados de estimação ou na confrontação da entrega total a Cristo, que ainda resisto a fazer. Se for assim, é para pensar profundamente a minha vida, pois “se alguém não sabe governar a sua própria casa, terá cuidado da igreja de Deus?” (1Tm 3.5)! Esta reflexão e constatação cabem somente a mim e somente o Espírito pode revelar-me inteiramente isso. Mas se me nego a pensar, também me nego a ser transformado...

Cristo edifica a sua igreja e afirma que as portas do inferno não prevalecerão contra ela (Mt 16.18). Como eu posso ser edificado se não quero afirmar categoricamente que faço parte da Igreja? Como poderei, assim, fazer com que o inferno não prevaleça contra mim? Preciso estar na igreja para saber “como convém andar na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, a coluna e firmeza da verdade” (1Tm 3.15)

Como disse alguém, a Igreja não é para ser conveniente, nem condescendente, mas contundente. Se eu quiser ser mais um na multidão, posso estar na igreja sem assumi-la. O problema disso é que Cristo não vai me conhecer quando isso for necessário (Mt 25). Mas se quiser ser discípulo, não devo fazer o que eu quero – sou instado a deixar o meu eu e assumir o fardo do meu irmão (Gl 6.2). Ser membro da Igreja é um passo fundamental e um grande desafio. Paulo concorda: “Além das coisas exteriores, me oprime cada dia o cuidado de todas as igrejas” (2Co 11.28), porque não basta estar no rol, é preciso estar por inteiro, pela vida inteira, com a inteira vida. Mas o resultado do compromisso pleno é, igualmente, grandioso: “Para que agora, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida dos principados e potestades nos céus” (Ef 3.10).

Pra. Hideide Brito Torres
www.hideide.blogspot.com
"A graça seja com todos os que amam sinceramente a nosso Senhor Jesus Cristo" (Efésios 6.24)

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Como fazer uma análise semântica de um termo bíblico

Otávio Júlio Torres

  1. Usar a concordância para enumerar as passagens nas quais ocorre a palavra analisada;
  2. Estabelecer os contextos em que a expressão ocorre;
  3. Agrupar os textos nos quais a palavra ocorre, separando-os por tipos de texto ou gêneros literários;
  4. Citar as expressões com as quais a palavra aparece mais freqüentemente. Fazer uma lista das palavras que semanticamente são afins ou contrárias à palavra analisada;
  5. Preparar uma matriz na qual se possa agrupar as características semânticas comuns e aquelas que são diversas da palavra a confrontar;
  6. Formular definições da palavra a partir das matizes encontradas.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Família: padrões versus relacionamentos

Otávio Júlio Torres

Dizer que o modelo de família nuclear — pai, mãe e filhos/as — é uma instituição divina é uma afirmação contraditória, embora esta idéia seja muito difundida hoje em dia por lideranças religiosas. Primeiramente, contraditória, porque a Bíblia não apresenta apenas um modelo de constituição familiar. Ao contrário, a experiência bíblica de família testemunha uma variedade marcante de vivências. No contexto do Antigo Testamento, por exemplo, várias são as passagens que referem-se a famílias poligâmicas (em que o homem tem mais cônjuges) e clânicas (ajuntamento de diversos casais e seus respectivos filhos/as consangüíneos, provavelmente até terceira e quarta gerações, e incluía também viúvos/as, órfãos/as, escravos/as, servos/as e estrangeiros/as.

Além dessas variações no aspecto social, os relacionamentos familiares na Bíblia também não eram vitalícios. Embora creiamos que Deus não se alegra com a divisão da família, Jesus mesmo considera a possibilidade do divórcio, da separação e desencontro de um casal (texto). Esse segundo aspecto demonstra com mais ênfase ainda a impossibilidade de a família ser uma instituição divina, pois entendemos por instituição divina apenas a Ceia do Senhor e o Batismo. Isso porque somente estes são sacramentos por ordenamento de Jesus. Dizer que algo é sagrado, divino é afirmar sua imutabilidade, sua invariabilidade, mesmo diante de mudanças históricas, humanas.

Sendo assim, não é possível que a família seja uma instituição divina. A Bíblia não afirma isso! Se a família fosse de fato divina, sagrada, ou seja, indissolúvel, intocável, como os sacramentos da Ceia e o do Batismo, sem a possibilidade de sofrer mudanças a partir da vontade humana, como explicar tantas transformações encontradas no interior da família no decorrer do processo histórico da humanidade? Confessamos que desconhecemos uma resposta satisfatória a esta questão, se partirmos da concepção de que a família é uma instituição divina.

É por acreditar que a família é uma instituição divina é que muitos cristãos e cristãs têm defendido também que existe um padrão divino para as relações familiares. Pensar que cada membro da família tem funções predeterminadas e imutáveis é uma proposta que exclui, limita e tolhe uma busca mais plena e interativa de relacionamentos conjugais e familiares que promovam a vida. Essa idéia de padrão divino para as relações familiares ainda dificulta a compreensão da graça, que proporciona ao ser humano um relacionamento mais próximo e livre com Deus e com o semelhante.

Acredito que, em vez de lutarmos por um “padrão divino” para a família, seria mais bíblico encontrar caminhos para nossas famílias em que a vida e o bem-estar de seus membros fossem priorizados. Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo é cumprimento de toda a Lei (Mateus 22.37-40). A proposta, portanto, desta pastoral, é mostrar que a Bíblia, ao narrar relações familiares, não apresenta um modelo que deva ser seguido como uma proposta divina no decorrer de toda a história humana. Diferentemente disto, a Bíblia reafirma que a família está envolvida no processo histórico da humanidade e, nesse sentido, sofre mudanças e se reorganiza, muitas vezes, sob novas formas. Por isso, ao lermos o Antigo Testamento, podemos perceber que foi muito tranqüilo para o povo de Israel viver sob uma organização familiar poligâmica (Gênesis 16.3; 1 Samuel 1.1-2; 2 Samuel 5.13). Já no Novo Testamento, a carta a Timóteo traz uma nova orientação para o dirigente da comunidade: O diácono seja marido de uma só mulher... (1 Timóteo 3.12).

Dessa forma, não precisamos nos espantar ao encontrar no seio de nossas Igrejas famílias constituídas por avôs e seus netos e netas, mães sozinhas com seus filhos, famílias adotivas (com crianças que não foram geradas biologicamente pelo casal), casais sem filhos, amigos que decidem morar juntos, etc. Podemos ver nesses casos não uma distorção da realidade familiar, mas novas formas de ser e estar juntos. Gosto muito de uma frase, dita por uma criança e recontada por Déa Kerr Afini, que diz: “Lar é uma porção de gentes que se amam”. Essa, sim, é a verdadeira constituição familiar, segundo o ensino do Mestre, no qual os laços de amor são a real fonte e fundamento da vida.